O tratamento do dependente químico envolve dois elementos: ele próprio e a família. Para que o tratamento tenha êxito, é necessário que além do dependente, seja tratada a família.  Os Alcoólicos Anônimos criaram o conceito de “doença da família” em meados dos anos 40, e desde então a idéia de se tratar a família tem sido amplamente utilizada pelos terapeutas. 

Muitas vezes, os familiares desconhecem a natureza da dependência química, e ficam sem saber como lidar com o problema. O primeiro passo é a conscientização: sair do senso comum, entender a dependência química como uma doença, e partir para a mudança de padrões e comportamentos. Aí está uma das maiores dificuldades. 

Alguns familiares têm a idéia de que uma internação por si só irá resolver o problema. Entregam o dependente aos cuidados de uma clínica ou comunidade terapêutica, e querem recebê-lo novo em folha dentro de alguns meses, sem se comprometer com o tratamento. Como isso não acontece, não existe cura nem mágica para a doença, a família se frustra e começa a procurar culpados: a equipe profissional, o próprio dependente “que não tem jeito”, “não se emenda”. Infelizmente essa é uma realidade que temos visto se reproduzir desde a infância: pais que delegam a educação dos filhos à escola, e mais tarde às clínicas de recuperação, ou nas piores hipóteses às cadeias e cemitérios.

Quando se fala em prevenção, entendemos que ela começa dentro de casa; é o olhar atento dos pais, o cuidado, a atenção, a educação. Obviamente que os pais não podem ser culpados pela dependência do filho, é uma questão multifatorial, porém é sabido que a família tem papel fundamental tanto na recuperação como na recaída do dependente. 

 Pais ou familiares facilitadores são coniventes com o uso e suas consequências.  A dependência é uma doença que levou certo tempo para se instalar na vida da pessoa. Seus sintomas apareceram aos poucos: o comprometimento no desempenho escolar, no trabalho, nos relacionamentos, no comportamento, tenham sido percebidos ou não. 

Pela lógica, algo que demorou anos para se instalar, não pode “desaparecer” simplesmente. A dependência química não se resume ao fato de usar ou não usar substâncias. É uma doença que afeta comportamentos. O dependente pode estar limpo (não estar fazendo uso do químico) e ter um comportamento de descontrole, manipulações, desonestidades. Agindo assim, podemos prever uma recaída em breve. 

Então podemos entender que a dependência química é complexa, e exige esforços conjuntos para ser superada. A recuperação se dá todos os dias, um de cada vez.  É aí que entra o papel mais importante da família: o suporte. 

Estabelecendo com o dependente regras que previnam a recaída. Todo o tratamento começa com um mapeamento dos fatores e locais de risco de recaída. Trata-se de chamá-lo à reflexão e a responsabilidade sempre que esse, sem perceber ou se testar se expuser ao risco da recaída.

O dependente precisa de apoio para superar as dificuldades e estabelecer uma nova maneira de viver (vida sem drogas). Qual a realidade dessa pessoa que acabou de sair de um tratamento?

Vida profissional: a pessoa pode estar fora do mercado de trabalho há muitos anos, desatualizada e sem contatos que lhe proporcionem voltar em curto prazo. Pode não ter uma qualificação. Pode ter comprometimentos físicos que a impeçam de trabalhar. Nesse caso, qual sua expectativa?

Relacionamentos: há dificuldade em se relacionar com as pessoas, tolerar as frustrações, a pessoa se vê sozinha pois seus amigos eram na verdade os companheiros de uso, pode ter se separado ou ter um relacionamento tóxico.

Emocional: o dependente tem uma autocrítica elevada, e forte tendência a autopiedade. Como ele está? Saiu do tratamento esperançoso e animado, ou está frustrado e depressivo ao se deparar com a realidade? Está disposto a continuar o tratamento através de atendimentos ambulatoriais e/ou freqüentar grupos de ajuda?

O fantasma da adicção ativa: no auge do descontrole, o dependente desestruturou a família, magoou e prejudicou pessoas. Fazer reparações são parte da recuperação. No entanto, é preciso entender que se trata de uma doença, e num primeiro momento o apoio da família é fundamental para mantê-lo motivado. Chegará o momento de “lavar a roupa suja”, mas que isso ocorra quando todos estiverem fortalecidos, em condições de dialogar, com mais razão e menos emoção. Caso isso não seja possível, o ideal é que se busque um mediador, uma figura neutra. De preferência um profissional da área.

Cada família tem sua dinâmica própria, porém é importante que todos se unam no propósito de colaborar com a recuperação do dependente, e descubram juntos, uma nova maneira de viver.

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